Muita gente reclama que no futebol de hoje não existe mais amor à camiseta. E ninguém faz um “mea culpa”: os culpados são apenas os jogadores “mercenários” que não estão nem aí para o time e para a torcida. Mas será que nós, os torcedores fiéis e apaixonados, não temos parcela de culpa nessa história toda?

Respondo: temos. Sim, nossa devoção é gigante e não estamos ligando para o dinheiro. Pelo contrário, gastamos em prol do nosso clube. Mas nossa culpa é por sermos CÚMPLICES dessa baixaria toda que rola no futebol moderno.

É a lógica do aparelho de som roubado: um marginal quebra o vidro do teu carro e furta teu som. O que tu faz? Compra um novinho, gastando uma fortuna novamente, ou compra um “frio”, nas mãos de um picareta qualquer, por um preço umas 5 vezes menor? A maioria das pessoas fica com a segunda opção. “Não vou gastar tudo de novo, vou comprar desse cara mesmo”. Pois esse cara vende rádio roubado. Se ninguém comprasse dele, não roubariam mais. Sei que parece simplista, mas se tu compra desses caras, parte da culpa por terem roubado teu som é tua.

Agora pensem comigo: flamenguistas ficaram INDIGNADOS com o Ronaldo Nazário, que sempre fez juras de amor ao rubro-negro e acabou jogando no Corinthians. Queimaram fotos dele, ostentaram cartazes com travestis, criaram cânticos de repúdio ao Fenômeno, enfim, não aceitaram a traição. Já os corintianos, mesmo sabendo da “sacanagem” do R9, o receberam de braços abertos. E é aqui que entra nossa cumplicidade e culpa.

Pois esse MESMO FLAMENGO recebeu Ronaldinho Gaúcho de braços abertos, mesmo sabendo do histórico de sacanagens do dentuço para com o Grêmio. A torcida gremista não quer mais vê-lo nem pintado de ouro: persona non grata. E os mesmos flamenguistas que se sentiram traídos acolheram calorosamente outro traíra. A lógica é: “se não foi comigo, tudo bem que seja um sacana”.

E é nessa cumplicidade que temos culpa. Todas as torcidas deviam refutar o R10 devido ao seu caráter duvidoso. A atitude do Flamengo ao adorá-lo só incentiva novos Ronaldinhos Brasil afora. O Corinthians aceitou o Nazário feliz da vida, mas amanhã esse episódio pode ocorrer CONTRA os corintianos. E aí não adianta chorar.

O caso “Ronaldo Fenômeno – Flamengo – Ronaldinho Gaúcho” é emblemático, mas não é único. Eu já recebi o Christian de braços abertos, um dos maiores ídolos colorados da década de 90. Fez gol da vitória no Gre-nal em pleno Beira-Rio em 2003 e vibrou feito louco: achei o máximo. Depois Tinga foi pro Inter fazendo juras de amor ao colorado: rapaz criado no Olímpico, ídolo da torcida, Tetra Campeão da Copa do Brasil pelo Tricolor. Todos os colorados acharam o máximo. E não é pra menos, Tinga fez até gol na Final da Libertadores 2006, ajudando o Inter a conquistar seu primeiro título internacional relevante. Qualquer colorado diria: “grande coisa se era do Grêmio e fez história lá, o que importa são os títulos que nos deu”. Ok, se é SÓ isso que importa no futebol, então tenho que dar razão ao Ronaldinho Gaúcho e cia. Então não podemos reclamar de nada e tampouco chamá-los de mercenários.

Óbvio que são profissionais, não estou falando em fidelidade ETERNA a um clube. Mas tem casos específicos. Tinga era um deles. Rubens Cardoso também havia jogado no Grêmio e sagrou-se Campeão da América pelo colorado em 2006: não me afetou em nada. É um cara perante o qual sou indiferente. Mas Tinga tinha uma história aqui, era querido por todos. Podia jogar em qualquer clube do mundo, menos no Inter. E casos como os do R9 e R10 dispensam explicações no sentido de representatividade desses atletas para seus “até então” clubes do coração.

Então é isso, somos cúmplices dessa putaria. Se negássemos traíras que machucaram os sentimentos de outras torcidas, eliminaríamos esse tipo de conduta. Mas não estamos nem aí: parecemos pintos no lixo quando algum bom jogador acena com a possibilidade de atuar em nosso time. É uma alegria cega, que não enxerga seus passados e suas atitudes. Só que nesse conglomerado de cegos, uma hora ou outra todos vão acabar se machucando.

Saudações,

@lucasvon